Escondido

Photo by Anshu A on Unsplash

Vou guardar meu amor num frasquinho. Conservar o pouquinho que sobrou. Esconder no fundo de alguma gaveta bagunçada pra nem eu mesma achar. E no dia que eu me deparar com tal recipiente, então eu vou saber. Vou saber que é você, e que vale o desgaste, o risco, a coragem meio camicaze. Vou tirar o amor do frasco, permitir que ele cresça, preencha os espaços, ocupe os cômodos que estão vazios e empoeirados.
Tudo o que escuto agora é eco. A minha própria voz reverberando nas paredes e lugares desocupados da casa. Tudo o que eu entendo é que não posso entender tudo. Não importa o quanto eu me esforce, eu sempre vou deixar algum detalhe passar. Alguns detalhes não são matematicamente discernidos. E que bom. Sou horrível em matemática. Mas pro que a gente sente não tem cálculo, não tem fórmula, não tem professor. E é por isso que eu vou colocar meu amor num frasquinho. Porque eu não sei o que fazer com ele agora.
Vou deixar lá. No canto. Junto com os clips perdidos e alfinetes que eu nunca lembro onde guardei. Junto com as notas fiscais de produtos que já parei de usar. Junto com algum pedaço de durex usado e embolado. Tudo junto naquela gaveta do lado da cama em que eu só entulho as coisas e nunca me dou tempo de arrumar. Junto com alguma carta que eu escrevi pra mim mesma, pra lembrar de viver, de sentir e de não ter medo. A qual nunca leio. Junto com arame de enrolar saco de pão e post its sem cola. Junto de metades de remédios, cartelas vazias e tarrachas de brincos perdidas. Junto do bom senso, fitas coloridas e panfletos de academia.
Um frasquinho de amor perdido no meio disso tudo. Um frasquinho de amor no meio do caos, da bagunça da vida e da rotina. Um frasquinho de amor escondido, esperando ser encontrado na hora certa. Pra valer o tempo, pra pegar de surpresa no meio de uma tarde de tédio e de reciclagem. Pra encher os olhos d’água, o coração de esperança e o estômago de borboletas. Pra ouvir música com emoção e chorar vendo o filme reprisado da Sessão da Tarde.
Pra você é só um frasquinho de amor. Pra mim é um frasquinho de amor escondido, de alguém que se esconde do amor pra fazer de conta que não precisa dele.
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A vida não para

Photo by Paul Green on Unsplash

Tem que saber sorrir. Mesmo que nada faça sentido e não tenha ninguém disposto a te ouvir. Tem que saber se virar com a solidão, dançar ao som da sua música favorita e descansar os olhos no fim da tarde, esticando aquele sono de depois do almoço. Tem que haver disposição, tem que largar de preguiça, tem que sair da caverna em algum momento. Tem que pegar chuva, pisar na poça e se sujar com a lama. Tem que suar, tem que fazer valer e tem que saber se levantar.

Enquanto a água morna batia nas minhas costas, eu pensava que ninguém aparece no nosso caminho por acaso. Nem as piores pessoas, já que elas nos deixam mais espertos. E aí eu pensei que talvez tudo faça muito mais sentido do que o pouco sentido que eu encontrei. Talvez não seja nada do que eu tô pensando e sim algo muito maior e mais valioso. E, apesar de querer muito saber o que acontece a seguir, imagino que talvez as próximas cenas não me surpreendam, mas me tornem bem mais disposta e confiante.
A vida não para. Não canso de repetir pra mim mesma. Não paro de repensar essas palavras pra ver se o medo sara e se o impulso de me proteger não é meramente me acomodar. A vida não para. E eu não parei pra pensar. Pensei enquanto andava. Enquanto pegava chuva, enquanto suava tentando fazer valer a pena, enquanto ria de mim mesma, enquanto dançava com a solidão, enquanto eu limpava meus sapatos sujos de lama, enquanto eu despertava do sono da tarde, enquanto eu falava sozinha e esperava você sorrir pra mim. A vida não para…
Mesmo que você jamais sorria de volta.
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Déjà vu

Photo by Mario Azzi on Unsplash

Queria que você sentisse a minha falta como eu sinto a sua. E queria não precisar o tempo todo te lembrar que estou aqui. Sabe, essa parece ser mais uma das histórias que eu junto no currículo da vida pra me sentir experiente o bastante pra dar conselhos. Por mais que você seja tão diferente de tudo o que já passou por mim, ainda vejo similaridades, tenho déjà vu. E aí eu me recolho num canto, tentando não ligar, tentando apagar ou amenizar os danos de ter acreditado sozinha de novo.
Há dias como hoje em que eu tento dar um nome, colocar um rótulo e enfiar dentro de uma categoria, só pra me assustar menos, sentir menos, sofrer menos. Mas eu nem acredito que isso seja mesmo possível, mesmo sabendo que eu já deveria estar calejada, acostumada, curtida. Esse não é tipo de coisa a qual eu queira me acostumar a viver. Então sim, estou mais uma vez tirando o time de campo, querendo dar um tempo de tudo, sumir por uns tempos. Mas só paro de falar de mim o tempo todo e tento ser toda ouvidos pra pessoas diferentes.
Às vezes eu me pego olhando pro nada, visualizando uma cena que eu criei. Algumas vezes a cena é boa, na maioria das vezes é só o que eu tenho medo de reviver. Eu nunca chego a nenhum lugar bom com isso. E tento compensar produzindo alguma coisa útil, pra aliviar o peito, a consciência, pra não me sentir tão louca e egoísta por querer que você pense em mim tanto assim… A ponto de se sentir triste me imaginando com outro alguém. A ponto de perder a fome ou acordar com um sentimento confuso e que não diz nada.
Ontem eu fui dormir pensando que a gente não controla nada. Que a vida é isso e a gente precisa aprender a viver bem com o que tem. Você estava presente nesses pensamentos como um expectador. E eu queria poder quebrar a tela entre nós pra sentir um abraço que pudesse me levar pra longe de tudo.
Mas eu continuo aqui.
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